Inguri às 17.30
Para trás fica a cidade, morta de arrogância e solidão. 17 horas e 30 minutos. É a hora Inguri. O feitiço de Angoche num momento mágico, como se tudo renascesse naquele instante. Embriago-me de cores, formas e movimento. Os mercados e as ruas agitam-se com a abundância de pescado. Proprietários, rendeiros, puxadores de rede, revendedores, vendedores de gelo, processadores, transportadores, consumidores…a cadeia de negócios parece perfeita. Os jovens regressam da escola animados, com os uniformes desfraldados. Simulam coreografias, debatem futebol e maldizem dos testes finais, inoportunos. Pares de namorados fecham-se em sedentas intimidades. Casais, provavelmente na angústia dos primeiros encontros, investem insinuações nervosas. Capulanas ao vento acenam para sol que se despede, alaranjado. O céu pinta-se de tons misteriosos e anima-se de padrões ímpares. Rostos de msiro sorriem para a vida. Ao longe, um tufo melodioso invade o insistente anunciar do maghrib, um dos cinco chamamentos diários de Allah. Sigo o batuque e as vozes até ao local dos ensaios, casa da madrinha do grupo. Autorizam-me a entrar. O ritmo engole-me. Entro nos segredos da dança. Tabus e fetiches em perfeita união. Êxtase ao som do Aussafi Sania do Inguri. O sol põe-se. A noite recomenda outros encantos. O bairro não dorme, até que o amanhecer obrigue a um novo retorno para a cidade. Angoche é Inguri.
12 Comments:
Como dizia o J P Borges Coelho, em África "o sobrenatural é muito concreto". beijo
Faz-me lembrar, com nostalgia, uma das letras do Gilberto Gil:
Por ser de lá do sertão
Lá do serrado
Lá do interior do mato
Da catinga, do roçado
(...)
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade sem viver contrariado
...
nostalgia à parte, é bom saber que há lugares que resistem à afirmação local de parametros hegemónicos de beleza... de viver!
Parabéns pela sensibilidade de captar a singularidade e quem dera, pudesse aceitar o convite para agosto.
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Feliz por te voltar a ler, André!!, abraço, IO.
Provavelmente assim seja em todos os continentes, Madalena. Quanto ao nosso, confirma-se, sim.
Sou nostálgico em relação a um pouco de tudo, Mangue. Vou aproveitando as circunstâncias.
Uma nota: não sei se é possível apagar-se o próprio comentário (dada a hora em que foi apagado...foste tu Mangue?). Não faço qualquer censura no blog.
Abraços
Muito obrigado, IO. Bj
Sim André, fui eu que apaguei o comentário. Por lapso, saiu repetido.
Abraços,
André amigo,
Já estava à espera de um grande desafio vindo de Angoche. Mas este foi em demasia...Que fazer quando os talentos do autor e do comentador não se desenvolvem ao mesmo ritmo? Mesmo assim, por inconfessáveis motivações, não posso desistir. Pergunto-te pelos silêncios do post: A fuga da cidade pelo excesso de cidade? A embriaguês (de cores , formas etc, claro!) pela arrogância e solidão? Quantas vidas cabem nos rostos de msiro? Desde quando é que a dança é para ti um segredo? Se, como dizes, é o ritmo que te engole? E depois do retorno, uma inexplicável má disposição?
Assim é amigo: pintas a vida com lápis de cores.Eu sei que ocupei muito espaço no teu blog, mas foi para ti.
Olá, tantas perguntas, a exigir um novo sótão! Ocupa o espaço que quiseres. Má disposição?! A que horas foi? Tudo se explica, claro.
Bj
thank you for remainding me the culture of my homeland, i have been there for a long time.
thank you for reminding me the culture of my homeland, i have been there for a long time.
Eu é que agradeço pela visita, Suleimane. Volte sempre. Abraço.
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