Tuesday, November 14, 2006

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«Casquilho do triângulo da frente», o meu desespero. Nunca tinha ouvido tal nome. Peça abundante, mas estranhamente escassa a série que me serve. Revoltante, ainda mais por ser minúscula. Conduz-me a um mercado de gente diversa, de casa em casa. Na primeira, o computador fornece-me a referência certa, mas que só recebo através de um esquema. Maldita concorrência. Tento outra sorte. Suponho que me dissimula a ignorância, dizer a referência de memória. Engano-me. Fico balançado perante a insistência de um vendedor sabido. Uma opinião amiga desvenda a trampa. Ao vendedor serve a carapuça de um certo estereótipo. Debato-me. Sigo. Numa cave sombria, entre o folhear de catálogos desajustados e obsoletos, recebo promessas de encomendas da África do Sul, para os próximos dias. Volto mais tarde e fico a saber por outras pessoas que, estando os sócios desavindos, não aceitam encomendas. Noutros lugares, não há nada que substitua os olhos do vendedor: «traz amostra!», é incontornável. Não há referência ou catálogo que sirva, muito menos os documentos do carro. Um esclarecimento adicional antecipa-se à indignação: «aqui em Moçambique você não pode dizer que este carro é isto ou aquilo…é uma mistura de marcas e modelos…e os documentos também sabes como funcionam as coisas». Não contesto a cumplicidade. Rumo para uma oficina-tasca. Surpreende-me a proprietária, mulher conhecedora de peças. Os preconceitos perseguem-me. Puxo conversa. Explica-me motivações e exibe orgulhos. O marido do lado de lá, do lado da tasca, enrola-se entre goles de whisky velho. Alinho numa bebida. Aqui também se aconselha o empirismo. Medidas tiradas, por atenção especial, amanhã receberia uma peça «arranjada à maneira». De bónus, recebo uma fraterna palmada nas costas. O ar matreiro diz-me tudo. Entro em mais três casas. Recomendam-me uma, com convicção. A nacionalidade do proprietário é referência segura: «vendem tudo». Lá está! Vejo e revejo catálogos, interrogo, suspeito, corrijo as medidas, apalpo, cheiro…verdadeiro casquilho a peça! À saída lembro-me que não me passaram a factura. Outro estereótipo que se acomoda. Persegue-me agora a treta do Estado… o estereótipo mais estúpido…! E os fantasmas a sussurrarem-me…carpe diem

9 Comments:

Anonymous Anonymous said...

Mano,

Não sei se já te tinha dito, mas a tua escrita é cativante. Gosto muito de vir aqui ao teu blog ler as tuas prosas.

Abraço,
Rui

9:51 AM  
Blogger Nkhululeko said...

Obrigado, Rui M. Quando é que estás por cá? Abraço.

9:54 PM  
Anonymous Anonymous said...

Já agora a nacionalidade do tem tudo? Se não ferir sensibilidades!

12:29 AM  
Anonymous Anonymous said...

Por "cá" referes-te a Mpt? Um dias destes, meu mano, um dia destes...

10:22 AM  
Blogger Nkhululeko said...

Carlos, coloca-se essa hipótese, sim.
Esperamos por ti, Rui. Já lá vai muito tempo.

2:55 PM  
Anonymous Anonymous said...

É bom saber disso.
Ainda nos havemos de sentar na mesma bancada onde há muito tempo atrás eu sentava-me na última fila e, em plena prova dos 100m livres, batia com a mão no telhado de zinco e gritava "Puxa Pucho, puxa Pucho". :)

4:37 PM  
Blogger Nkhululeko said...

Hehehe...e eu a ficar para trás...! Bons tempos. Temos lá estado regularmente, a malta de sempre...com alguma renovação. Excelente ambiente! Abraço.

8:04 PM  
Anonymous Anonymous said...

Qual hipótese....eh,eh,eh!

1:04 AM  
Blogger Nkhululeko said...

De ferir susceptibilidades, pelo menos neste caso.

1:14 AM  

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